Wade Wilson é Deadpool, certo? Hmmm… Não sei, não posso dizer…

Uma das características mais “atraentes” de Deadpool para os leitores (e fãs de cinema) é a sua loucura inconsequente e quase non-sense, misturando pastelão, violência, humor negro, alucinações e tragédia (sim, Deadpool é um daqueles personagens que, mesmo quando vence, se dá mal), mas ele nem sempre foi assim. De fato, em sua primeira aparição, ele estava até sério, rancoroso e “profissional”. O mercenário tagarela começou a se “liberar” nas aparições seguintes, até o lançamento de sua primeira série regular (1997), sob a batuta do roteirista Joe Kelly.

Embora essa seja uma das fases mais consistentes e elogiadas do personagem, Kelly seguiu o padrão do personagem até então (a loucura esquizofrênica e escalafobética viria na segunda metade dos anos 2000). No entanto, Kelly plantou “sementes” para o futuro desenvolvimento da caracterização do personagem – Deadpool começava ali a sair mais da casinha.

O ponto alto dessas “sementes” se deu entre as edições #27 (abril/1999) e #33 (outubro/1999) (com arte de Walter McDaniel, Pete Woods e David Brewer), em que fomos apresentados à esposa de Deadpool, que voltou da morte, e ao fato de que Deadpool não era Wade Wilson de verdade… ou era?

A propósito, os casamentos “esquecidos” de Deadpool têm sido repetitivos: além de Mercedes Wilson (de quem trataremos aqui), também tivemos Gretchen Wilson (da qual só vimos uma foto) e Carmelita Camacho (com quem ele teve uma filha) – isso sem contar a “rainha dos monstros” Shiklah, com a qual Deadpool se casou mais recentemente, depois se separou e optou por esquecer. (E, claro, não vamos esquecer de mencionar que ele teve uma esposa alienígena [chamada Orksa] por “acidente” e teve vários affairs no mundo das super-heroínas e mercenárias – é um “pedaço de mau caminho”… hehe.)

Enfim, vamos ao que interessa – Deadpool foi se consultar com um psiquiatra – o vilão Doctor Bong (arqui-inimigo de Howard o Pato) – não, não era a coisa mais confiável a se fazer, mas em se tratando de Deadpool, não surpreende. Deadpool começou a alucinar com coelhos assassinos e uma mulher – sua esposa Mercedes Wilson – da qual ele não se lembrava. Diagnóstico feito pelo Doctor Bong: Deadpool enlouqueceu!

O fantasma de Mercedes desapareceu quando a verdadeira Mercedes retornou da morte! Isso foi obra de um dos inimigos de Deadpool, o também supermercenário T-Ray, que a reviveu misticamente para… se vingar de Deadpool. A ideia era torturar psicologicamente Deadpool, com uma esposa submissa e carente que voltara inexplicavelmente da morte… até que a verdade se impusesse, afetando Deadpool em seu momento de maior remorso.

E o plano deu certo. T-Ray apareceu e revelou que ele era o verdadeiro Wade Wilson, casado com Mercedes! Sim, o casal Wilson vivia tranquila e pacatamente em uma cabana, até caírem na besteira de acolher um mercenário psicopata ferido que fugia de seus inimigos. Esse mercenário se chamava Jack, e usava um traje parecido com o de Deadpool (sem a máscara). E aí, Jack ficou se recuperando e cobiçando a relação dos Wilson… o que o levou a desenvolver um plano para assumir progressivamente a vida de Wade Wilson, inclusive a esposa.

Chegou o momento para fazer isso, quando Mercedes saiu para fazer compras, e Jack golpeou a cabeça de Wade para depois incendiar a cabana – só que Mercedes esqueceu a carteira e voltou para buscá-la, e pegou Jack com a boca na botija. No confronto entre os dois, Jack esfaqueou e matou Mercedes sem querer. Abandonando tudo, Jack resolveu assumir mesmo assim a identidade de Wade Wilson para se esconder de seus inimigos. Ah sim, tudo isso teria acontecido antes dos experimentos de fator de cura que transformaram Jack em Deadpool, e desestabilizaram ainda mais sua mente.

Acontece que o Wade “original” não morreu, e assumiu a vingança da destruição de sua vida (e de seu próprio nome) como missão de sua vida. Envolvendo-se com misticismo japonês, transformou-se em um “zumbi vivo”, mantendo intelecto e vontade própria, enquanto se tornou superforte, resistente a lesões e capaz de reviver mortos. Há informações de que ele não possui mais coração e que seus outros órgãos foram substituídos por terra – sim, ele se tornou um “morto-vivo” provavelmente de forma voluntária. Assumindo o codinome T-Ray, tornou-se um supermercenário rival de Deadpool, que guardou esse “segredo” até o momento certo.

Bem, o confronto terminou com T-Ray contando a “verdade” e humilhando Deadpool, que também foi esculachado por Mercedes (que agora se lembrava de tudo), que impediu que T-Ray o matasse. T-Ray e Mercedes se teleportaram para longe, com T-Ray falando “pode continuar usando esse nome, que se tornou um nome de derrotado!”. Mercedes nunca mais foi vista e T-Ray voltou a enfrentar Deadpool outras vezes, mas não tocou mais no assunto… o que aconteceu?

Joe Kelly terminou sua passagem pelo título com esse arco – “a verdade final” e deixou a bomba para o roteirista seguinte, Christopher James Priest, descascar… e ele ignorou… assim como todos os outros depois disso. Todos os outros menos um! Fabian Nicieza tocou no assunto de novo na série Cable and Deadpool (2004), em dois arcos: #38-39 (maio-junho/2007) e #47-48 (janeiro-fevereiro/2008) (com arte de Reilly Brown e Ron Lim). T-Ray retornou querendo dar o troco em Deadpool, sequestrando suas auxiliares Sandi e Outlaw, e aí se revelou que ele havia perdido sua alma… e terminamos com Deadpool e T-Ray compartilhando a mesma alma (??) – outra coisa que foi esquecida… hehe

O fato é que Nicieza brincou com a coisa e também não resolveu nada e, inclusive, começou a arranhar essa abordagem várias edições antes da revista Cable and Deadpool (2004), em que Deadpool estava sofrendo oscilações mentais e foi temporariamente estabilizado por Cable. Aí ele se lembrou de alguns fatos que “comprovavam” que ele era Wade Wilson de fato (como estar usando o uniforme de Deadpool na versão de T-Ray da história, muito antes de se tornar Deadpool e adotar o uniforme; ou ter registros militares em nome de Wade Wilson). Porém, tanto na fase Kelly quanto na fase Nicieza, há elementos que apontam para Deadpool ou T-Ray sendo o verdadeiro Wade Wilson. Nicieza até brincou com isso quando trouxe T-Ray de volta, ao fazê-lo também quebrar a quarta parede e conversar com o leitor – algo que “só o verdadeiro Wade Wilson faria”.

O fato é que o próprio Deadpool declarou que tanto ele quanto T-Ray são loucos e que, portanto, suas “memórias” não são confiáveis. Fim.

E, pensando bem, considerando o estilo das histórias de Deadpool, que diferença faz? Até mesmo a confusão fica ainda maior porque, com Deadpool e T-Ray dividindo a mesma alma, isso também é semelhante, em parte, à relação entre Deadpool e Agent X (de que já tratamos aqui no blog em outro post), cujas estruturas genéticas foram misturadas conjuntamente com as do vilão Black Swan. Some-se a isso que o fator de cura de Deadpool interfere em suas memórias, assim como também o coquetel experimental que ele se autoaplicou recentemente. Então, não importa saber quem é Wade Wilson – a não ser que apareça alguma futura história relevante sobre esse assunto… mas, até lá (se houver), não é nada que tire o sono dos leitores, nem dos mais fanáticos por cronologia… hehe

Fontes:

Official Handbook of the Marvel Universe

Wikipedia

Unofficial Appendix of the Marvel Universe

Revistas referidas

Infinity Gauntlet (1991) – O início da saga interminável (infinita? hehe) – parte 2

Como vimos na primeira parte do post, Thanos teve uma “vitória de Pirro” – continuou não conseguindo se dirigir diretamente à sua amada Death porque agora, com a Infinity Gauntlet montada, ele se tornava mais poderoso que ela, e a mesma não se sentia ser merecedora de tal honra. Mas isso não deteve Thanos, que continuou a tentar agradar sua amada – mesmo sendo onipotente e podendo fazer com que Death fizesse o que ele quisesse, ele queria merecer esse amor. E isso seria sua derrota, mais uma vez – aliás, Starlin se repetiu aqui mais uma vez, mas vamos adiante.

Antes de falarmos sobre a história da minissérie/evento Infinity Gauntlet em si, vamos falar sobre a minissérie. Starlin teve carta branca para fazer o que quisesse, embora isso não devesse ser duradouro. Ou seja, para contar sua história sobre os problemas da onipotência, Starlin poderia matar todo mundo, mas não haveria repercussão em outros títulos/séries. Houve alguns tie-ins, mas não tão ostensivamente quanto nas sequências Infinity War (1992) e Infinity Crusade (1993) – de qualquer forma, sem consequências duradouras.

Um dos temas recorrentes de Starlin é justamente um estudo da onipotência. Sempre crítico da religião, e investindo em discussões metafísicas, Starlin usa rotineiramente o niilista Thanos como sua cobaia, mostrando suas fraquezas e sua inadequação para a onipotência. Jim Shooter já havia tocado nisso também nas primeiras Secret Wars (1984), usando Doctor Doom nesse papel.

A volta de Starlin à Marvel estava sendo comemorada, desde que assumiu a série Silver Surfer (1987) em 1990, mas o grande retorno a ser comemorado em Infinity Gauntlet não era dele, mas era de George Pérez. Pérez era outro grande astro dos comics que começou na Marvel, mas estava na DC desde 1980 (quando reformulou Teen Titans com o roteirista Marv Wolfman, e fez a memorável Crisis on the Infinite Earths com o mesmo roteirista). Pérez também fazia sucesso com sua reformulação de Wonder Woman (a partir de 1987), onde estreou como roteirista. Pérez também estava fazendo (escrevendo e desenhando) o megaevento do ano da DC em 1991 – War of the Gods. Mesmo assim, foi contratado para ilustrar Infinity Gauntlet… e não aguentaria.

Wonder Woman de Pérez já estava em sua reta final e War of the Gods tinha críticas: ou seja, Pérez estava sob pressão. E ainda tinha de desenhar Infinity Gauntlet, esperando-se com seu detalhismo característico. Mesmo Pérez ainda não tendo desenvolvido seus problemas de saúde que atrapalham sua carreira nos últimos tempos, ele não suportou o estresse e, depois de atrasos, a Marvel entregou parte da quarta edição e as duas últimas edições de Infinity Gauntlet para Ron Lim, o desenhista de Silver Surfer na época. Essa turbulência com relação a Pérez não atrapalhou o interesse pela história, pelo menos.

Voltando à história do evento, Thanos começou mostrando que não tinha preparo para ser onipotente – quando devia estar acima de qualquer sentimento, Thanos resolveu fazer de tudo para conquistar o amor da Death. Primeiro fazendo um altar/templo, sem sucesso. Resolveu então assassinar metade do universo como oferenda (o que nos remete ao início de toda a trama, a razão pela qual Death ressuscitou Thanos). Nessa metade do universo, vários heróis reunidos por Silver Surfer desapareceram para o nada em um piscar de olhos. Isso não fui suficiente para conquistar Death, mas trouxe Adam Warlock, Gamora e Pip de volta ao mundo dos vivos.

Thanos ainda criou sua “mulher ideal”, chamada Terraxia, para criar ciúme em Death! Nada feito. Os heróis, agora liderados por Warlock, atacaram Thanos e, para impressionar Death, Thanos abriu mão de uma parte de sua onipotência, permitindo que os heróis pensassem que iriam vencer, para matar todos em um estalar de dedos, oferecendo suas mortes. Ainda nada feito.

Thanos partiu então para exterminar as entidades cósmicas que são personificações de conceitos abstratos. Sim, ele inclusive eliminou Eternity e assumiu seu lugar, tornando-se a essência do universo. E nem isso conquistou o coração de Death. Porém, parecia a vitória definitiva, não? Só parecia…

Ao “desencarnar”, Thanos deixou seu corpo e a Infinity Gauntlet no plano terreno, e a manopla foi pega pela agonizante Nebula, que ao usá-la para reparar sua saúde e seu corpo, resolveu também desfazer tudo que Thanos havia alterado no universo. Pronto, todas as mortes foram desfeitas e até mesmo a transformação de Thanos em essência do universo foi desfeita. Heróis e entidades cósmicas voltaram a confrontar Thanos, com a Infinity Gauntlet terminando sob guarda de Adam Warlock. A partir desse momento, Thanos fingiu se suicidar. Definido? Não.

Warlock quis manter a Infinity Gauntlet sob seu controle, mas os heróis e entidades cósmicas se revoltaram, considerando os episódios de loucura que Adam Warlock já demonstrou no passado. Isso foi tratado no julgamento de Warlock pelas entidades cósmicas, na primeira edição de Warlock and the Infinity Watch (1992), no qual se decidiu que ele deveria desfazer a manopla e repartir as Infinity Gems entre seus aliados, dando origem à Infinity Watch (já comentamos e analisamos essa série em outros posts aqui no blog). Warlock inclusive expulsou suas partes “má” (Magus) e “boa” (Goddess) de sua psique, para garantir que não sucumbiria à loucura. Essas partes, personificadas, seriam as vilãs dos eventos Infinity War e Infinity Crusade, respectivamente.

Já quanto a Thanos, revelou-se que ele ainda estava vivo, atuando como um agricultor em um planeta distante, contemplando seus erros e acertos. Essa versão de Thanos definiria uma parte da caracterização de Thanos por muitos anos e seria revisitada em Warlock and the Infinity Watch também. Thanos não é essencialmente mal (como praticamente todo vilão), mas ele abstrai maldade e bondade em termos de pragmatismo, para conseguir seus objetivos – que, por envolverem niilismo, não são geralmente vistas como “boas”… hehe

Infinity Gauntlet foi um grande sucesso na época de seu lançamento, embora tecnicamente não seja o melhor material produzido por Starlin. E foi mais uma parte essencial da “prisão temática” de Starlin – quando ele envereda por odisseias cósmicas, suas abordagens são invariavelmente repetitivas ou muito semelhantes – se não clara e diretamente, pelo menos em alguma altura da história.

E suas sequências não tiveram o mesmo nível, nem mesmo a série Warlock and the Infinity Watch (que já avaliamos aqui no blog como sendo totalmente supérflua). Mesmo assim, até hoje, Starlin continua retomando esses temas, com outras “Infinity alguma coisa” sendo lançadas na Marvel.

Alguém pode dizer que há diferenças nesses materiais, como, por exemplo, quando Magus e Goddess foram os vilões. De fato, o assunto em questão não era a onipotência, mas sim “estudos metafísicos” sobre o mal e o bem (quase) absolutos – mostrando que nenhum dos dois é desejável, porque existe a contaminação de outros elementos. E aí temos a síntese do “estudo metafísico” sobre a onipotência – não adianta você ser onipotente se sua mente não evolui. Ou, por outro lado, podemos ter uma interpretação não tão favorável ao Starlin – ele não consegue abstrair a caracterização individual quando trata desses temas, o que tornaria seus “estudos metafísicos” interessantes, porém igualmente contaminados. Existe até uma teoria física que fala exatamente isso: fenômenos físicos são afetados pelo observador.

De qualquer forma, Infinity Gauntlet ficou na memória coletiva dos fãs da Marvel de forma positiva, com a Infinity Gauntlet sendo usada novamente em várias outras histórias e situações. E, como não poderia deixar de ser, é um dos fios condutores do Universo Cinemático Marvel, sendo provavelmente a culminação de uma longa história que está sendo contada nos cinemas, lá em Avengers – Infinity War.

Fontes:

Revistas referenciadas

Official Handbook of the Marvel Universe

Wikipedia

Infinity Gauntlet (1991) – O início da saga interminável (infinita? hehe) – parte 1

No final dos anos 1970, Jim Starlin já era um grande nome na Marvel devido a seus períodos memoráveis escrevendo e desenhando as séries de Captain Marvel e Adam Warlock (já fizemos 2 posts aqui no blog sobre a conclusão da primeira saga de Warlock [de 1977]), e investindo no vilão niilista que criou – Thanos. Mas, mesmo assim, seu temperamento difícil fez com que se aventurasse pelo então incipiente mercado de séries autorais independentes. Nesse período, fez alguns trabalhos esporádicos para Marvel e DC (respectivamente, Death of Captain Marvel [Marvel] e OMAC e Firestorm [DC]), até desenvolver na editora Pacific o embrião de outra série cult e seminal (Dreadstar (1982)), também explorando a abordagem metafísica e crítica à religião no contexto das odisseias cósmicas. Starlin então se associou à Marvel como o principal criador do início do selo Epic (justamente com Dreadstar).

Starlin permaneceu na Epic até 1986, quando transferiu Dreadstar para a nova editora First (em 1986).  Terceirizando Dreadstar para outros criadores na First (como Peter David e Angel Medina), Starlin voltou a se estabelecer de modo mais fixo em uma das majors (agora na DC), na segunda metade dos anos 1980 – onde se dividiu entre histórias cósmicas e histórias mais urbanas e violentas envolvendo Batman. Starlin só retornaria à Marvel de forma mais fixa em 1990, agora como roteirista de Silver Surfer, com arte de Ron Lim.

E o que Starlin fez? Retomou seus plots de Adam Warlock e Thanos na série de Silver Surfer. A trama começa com Death (a personificação da Morte) percebendo uma superpopulação cósmica em todo o universo. Aparentemente, o equilíbrio entre vida e morte havia sido abalado, e isso deveria ser corrigido – para tanto, Death reviveu Thanos (a morte recriando vida… temos um dilema metafísico aí? hehe). Mesmo ainda sem falar diretamente com Thanos (a quem julgava inferior), Death avisou, por meio de um lacaio, que Silver Surfer seria um estorvo para essa missão de corrigir o desequilíbrio cósmico. Logo, para agradar sua amada, Thanos tinha de se livrar do ex-arauto de Galactus e aí empreendeu um estratagema complicado para enganar Silver Surfer, fazendo com que este achasse que tinha eliminado Thanos e ficasse preso no inferno burocrático de Dynamo City, uma estação espacial do tamanho de um planeta.

Starlin também já havia promovido a volta de outra criação sua, Drax the Destroyer (embora com a mente avariada), que é o “anti-Thanos” por excelência e, como de hábito, quis se livrar do que não havia sido criado por ele com relação a Thanos – ou seja, “matou” Nebula, que se autointitulava neta de Thanos (Nebula retornaria um pouco mais à frente, para ser torturada por Thanos e, por fim, levar à sua derrota).

Com o caminho livre, Thanos recebeu permissão de Death para se dedicar a seu plano que passava por resgatar as Infinity Gems (lembram? usadas na saga de Adam Warlock contra Thanos?) – ainda chamadas coletivamente de Soul Gems (só passariam a ser chamadas de Infinity Gems no evento Infinity Gauntlet propriamente dito). O objetivo era reuni-las em um só artefato… a Infinity Gauntlet (Manopla do Infinito). E, para mostrar isso em detalhes, Jim Starlin e Ron Lim produziram uma minissérie em duas partes chamada Thanos Quest (1990) (setembro-outubro/1990). Thanos começou capturando a Soul Gem propriamente dita (contendo as almas de Adam Warlock, Gamora e Pip), que estava em outro plano de realidade, sob tutela da entidade In-Betweener. As demais joias foram sendo capturadas entre os Elders of the Universe, por meio de confrontos ou truques.

Thanos acreditava que, agora com a Infinity Gauntlet, estaria finalmente no mesmo nível de poder que Death e poderia enfim concretizar sua paixão. Bem, não foi bem assim – Death agora era inferior a Thanos e, portanto, não tinha “permissão” para falar com ele. Thanos foi derrotado pelo poder absoluto que amealhou… mas esse final frustrante de Thanos Quest (que levou o vilão a chorar!) não era o fim da saga… era apenas o começo!

No entanto, isso não fez Thanos desistir da Infinity Gauntlet e também não o fez desistir de conquistar seu amor. Sim, como onipotente, Thanos sabia que poderia fazer com que Death o amasse e o servisse, mas ele queria se mostrar merecedor disso – guarde essa informação, pois ela entrará na discussão.

Bom, eventualmente Silver Surfer se livrou do inferno burocrático de Dynamo City e soube que Thanos não havia morrido. Obviamente Thanos baniu a alma de seus opositores (Silver Surfer e Drax) para o interior da Soul Gem (já habitada por Adam Warlock e seus amigos Pip e Gamora). Thanos também soube que Nebula não havia morrido, embora estivesse perto disso. Resolveu então preservá-la nesse estágio de permanente agonia para sua diversão. E também tivemos a chegada de Mephisto. Sim, um dos lordes do Inferno quis se aproveitar da situação (e, se possível, pegar a Infinity Gauntlet para si) e se ofereceu como lacaio de Thanos. Para quê Mephisto precisaria da Infinity Gauntlet? Bom, há várias respostas, mas nenhuma delas parece ter comovido Thanos, obviamente – mas ele resolveu manter Mephisto como lacaio para sua diversão também.

Dentro da Soul Gem, Adam Warlock desenvolveu sintonia com os poderes da joia, e resolveu devolver Silver Surfer e Drax ao plano mortal, para que capitaneassem os heróis da Terra contra a ameaça do Thanos (mais uma vez) onipotente. Onisciente, Thanos descobre isso, mas deixa acontecer para se divertir. Aí temos as peças posicionadas para o evento Infinity Gauntlet.

Veremos a minissérie/evento Infinity Gauntlet (1991) na segunda parte deste post.

Fontes:

Revistas referenciadas

Official Handbook of the Marvel Universe

Fantastic Four de Jim Lee – o melhor de Heroes Reborn? – parte 2

Como falamos na primeira parte do post, Fantastic Four (1996) é tido como o melhor dos títulos de Heroes Reborn. Jim Lee corroteirizou as 12 edições com Brandon Choi, seu parceiro criativo já no principal título de Jim Lee na Image, Wild CATS. Lee também desenhou as primeiras 6 edições, com as 6 restantes sendo divididas por Brett Booth e Ron Lim.

Quando falamos de organização, estamos falando que Lee e Choi se preocuparam em ligar boa parte dos personagens entre si. Embora o roteiro seja algumas vezes raso (como era o padrão nessa época dos anos 1990), há uma rede de conexões entre os fatos, mostrando que houve planejamento. A própria “condição rasa” do roteiro poderia ser proposital – pois aparecem dicas aqui e ali que estamos vendo uma história “criada por uma criança”. E isso, na verdade, era o grande segredo de todas as revistas de Heroes Reborn: Franklin Richards era o “condutor” da origem recontada dos personagens.

Basicamente, tudo (na série Fantastic Four) era ligado a Galactus que, na versão Lee/Choi, assumiu uma caracterização semelhante à dos Celestials no universo original. Como assim? Eu explico: Galactus plantaria “sementes genéticas” em vários planetas eras atrás, para que esses planetas “amadurecessem” para que pudessem ser consumidos por ele. Ou seja, Galactus semearia vida ou, pelo menos, promoveria a evolução da vida com o objetivo de se alimentar dela. Seus arautos seriam responsáveis por verificar essas “plantações” e anunciar a chegada de Galactus para se alimentar.

Essas sementes genéticas seriam reforçadas pela energia cósmica (da criação do Universo), dominada por Galactus – essa energia cósmica daria os poderes aos arautos e também proporcionaria a abertura de buracos de minhoca para o transporte interestelar dos arautos e Galactus. Só isso? Não.

Os Inhumans teriam sua Terrigen Mist derivada dessas sementes e da energia cósmica. Por isso, adoravam Galactus e os arautos como deuses, assim como também Mole Man. Por outro lado, o próprio Fantastic Four ganhou seus poderes por exposição à energia cósmica que Silver Surfer trouxe ao se aproximar da Terra – aliás, a nave experimental em que Reed Richards trabalhava foi exposta a essa energia cósmica ao tentar chegar à “anomalia espacial” (o buraco de minhoca) antes que a SHIELD chegasse lá e a destruísse. A explosão da anomalia, junto com a chegada de Silver Surfer e mais a nave não protegida que continha o futuro Fantastic Four (nave batizada aqui como “Excelsior”) resultaram em seus poderes.

Essa “SHIELD”, porém, não era a verdadeira – era comandada por um “Wyatt Wingfoot” impostor (lembrando que, no Universo Marvel original, Wingfoot era amigo do Human Torch (Johnny Storm)). O impostor era um skrull – mais precisamente, Kl’rt (sim, o Super-Skrull).

Silver Surfer caiu na Terra em Wakanda, trazendo Black Panther à história. Isso atraiu o “Wingfoot” impostor e seu “chefe”, Doctor Doom. Doom queria absorver a energia cósmica de Silver Surfer para si – a mesma coisa que Kl’rt (que conseguiu, e se tornou o Super-Skrull).

Como se pode ver, tudo estava ligado e conectado… e a edição #12 é parte de um crossover dos quatro títulos de Heroes Reborn em que os heróis da Terra se juntam para enfrentar Galactus.

Lee e Choi também modernizaram os membros do Fantastic Four: Sue Storm e Johnny Storm se tornaram investidores da pesquisa de Reed Richards (que pretendia desenvolver um voo tripulado para Marte), representando a Storm Foundation; Johnny ainda era dono de um cassino em Las Vegas; já Ben Grimm era agora um veterano da Primeira Guerra do Golfo (1991) que tinha problemas em sua ficha corrida – amigo antigo de Reed, sonhava ser astronauta, mas só conseguia ser piloto de provas. A “técnica” de modernização foi a mesma que seria usada na concepção do Ultiverse alguns depois (se bem que, no Ultiverse, os membros do Fantastic Four foram rejuvenescidos).

Uma ideia que seria reaproveitada no Ultiverse foi a existência de um grupo de cientistas com origens ligadas: Reed Richards, Victor von Doom, Bruce Banner, Tony Stark, Hank Pym e Rebel o’Reilly (este criado especialmente em Heroes Reborn). Esse grupo, chamado de Atomic Knights of the Round Table, estava no cerne das tramas do universo de Heroes Reborn. Inclusive, a origem de Doctor Doom era ligada a esse grupo, em que ele quis testar sozinho um dos projetos do grupo: uma exoarmadura que, ao explodir, causou a desfiguração de Doom e se tornou sua armadura posterior.

Por fim, como já dissemos, começaram a surgir pistas de que os heróis “exilados” retornariam ao universo original, principalmente quando o Fantastic Four explorou a Negative Zone (aqui transformada em um universo de “passagem” (no caso, dos buracos de minhoca). Encontrando-se com o Watcher por lá, os membros do Fantastic Four viram cenas de seu “passado” (no universo original, onde eram mais velhos) e, a partir daí, Sue Richards (Invisible Woman) começou a ter visões de seu filho, Franklin, inclusive brincando com a bola azul (que era o próprio universo de Heroes Reborn). O próprio Doctor Doom “original” também apareceu em Heroes Reborn, dando informações à sua contraparte.

O sinal definitivo de que Heroes Reborn iria acabar foi que Sue, que seria estéril em Heroes Reborn, se viu grávida. Como? Isso não chegou a ser desenvolvido, mas mostrava nitidamente que o projeto chegava a seu fim.

Quando os heróis retornaram ao Universo Marvel e suas séries foram relançadas com grandes equipes criativas, as franquias estavam recuperadas. Se o efeito de renovação de interesse de Heroes Reborn foi passageiro, foi certeiro em sua “rejeição”: afinal, as franquias tiveram um ímpeto renovado quando as “versões originais” retornaram, como os fãs queriam.

Quanto a Fantastic Four de Jim Lee, é a única série de Heroes Reborn que foi reimpressa em encadernados pela Marvel por um bom período. Só isso já indica sua qualidade maior com relação às outras séries do selo. E, claro, o traço de Jim Lee nas primeiras seis edições também era um grande diferencial.

Fontes

Revistas referidas

HOWE, SEAN – Marvel Comics The Untold Story

SANDERSON, PETER – Marvel Chronicle

Wikipedia

Fantastic Four de Jim Lee – o melhor de Heroes Reborn? – parte 1

Heroes Reborn foi o primeiro experimento de terceirização da Marvel (o selo Marvel Knights, surgindo alguns anos depois, foi a mais bem sucedida dessas iniciativas) – por ele, a Marvel terceirizou a produção de histórias de Fantastic Four, Iron Man, Captain America e Avengers para os estúdios de Jim Lee (dois primeiros) e Rob Liefeld (dois últimos). Os dois eram membros do “grupo rebelde” que abandonou a Marvel em 1992 para formar a editora Image e começavam a retornar à Marvel com essa iniciativa.

A história dessa terceirização (que foi lançada oficialmente em novembro/1996) tem a ver com o momento econômico da Marvel (que protocolizou seu famoso pedido de concordata em dezembro/1996) e também com o péssimo perfil de vendas dos títulos envolvidos. É verdade que o projeto já estava em andamento meses antes de seu lançamento, mas já havia uma perspectiva de necessidade de medidas corretivas no plano empresarial da Marvel.

Ao contrário do que muitos dizem, a Marvel não pediu concordata por causa dos quadrinhos (que continuaram sempre liderando o mercado), mas sim porque quis se tornar uma “corporação”, adquirindo várias empresas de diferentes ramos de entretenimento. O tamanho que a Marvel atingiu era maior do que suas ações em bolsa podiam suportar.

Some-se a isso que 1996 também foi o ano do início da bolha especulativa do mercado de comics americano, que atingiu seu auge em 1997. Essa bolha especulativa se deu pela inundação de títulos e capas alternativas no mercado – comprava-se revistas para “investir” e, depois, revender. Isso estourou quando se percebeu que não havia quem comprasse (os especuladores eram mais ativos que os leitores e fãs).

Portanto, não só a Marvel sentiu um baque em suas vendas, mas as outras editoras também. No caso da Marvel, títulos regulares sem tradição ou público potencial foram cortados sumariamente, mas alguns títulos tradicionais da editora estavam vendendo mal e precisavam de atenção. Apesar de Captain America ter começado a reagir, com a equipe criativa de Mark Waid/Ron Garney (já fizemos um post do primeiro arco dessa fase aqui no blog), isso já não era suficiente para os executivos da Marvel.

Usando o evento Onslaught (1996) como pretexto, a Marvel “matou” os heróis que participariam da iniciativa Heroes Reborn, iniciando um período interessante em que o Universo Marvel lidava com a ausência trágica desses heróis. Por outro lado, esses heróis foram “rebootados” em outro universo (chamado Heroes Reborn), com histórias modernizadas e produzidas pelo pessoal da Image. Hoje sabemos que eles foram salvos pelos poderes inimagináveis de Franklin Richards (filho de Reed e Sue Richards, do Fantastic Four) e tiveram sua “história” reescrita pelo garoto.

O projeto deu certo, principalmente no lado da Wildstorm (estúdio de Jim Lee). As revistas capitaneadas por Rob Liefeld não tiveram tanto sucesso e ainda houve a quebra do contrato – Jim Lee assumiria as séries que estavam com Liefeld a partir da edição #7. Heroes Reborn durou 12 edições (novembro/1996-outubro/1997), e ainda houve uma décima-terceira edição das 4 séries, que foi um crossover com os personagens da própria Wildstorm (hoje na DC).

A Marvel ficou satisfeita com o resultado final, e já havia até um segundo ano planejado. Jim Lee já disse que a Marvel ofereceu a continuação indefinida do projeto, com a condição de que Lee desenhasse sempre uma série – e isso não teria sido aceito por Lee. Foi por isso que acabou?

Nem tanto, pois, após um grande sucesso movido pela curiosidade nas primeiras edições, as séries começaram a perder o interesse dos fãs. Havia também a grande reação dos fãs da Marvel, apontando que reboots não eram uma tradição da Marvel. Nesse período de internet inicial, os fóruns de discussão já cornetavam contra a iniciativa – e, provavelmente, essa foi uma das razões por que o Ultiverse nunca substituiu o Universo Marvel original, apesar de seu grande sucesso por um longo período. E isso começou a ficar nítido quando a Marvel começou a indicar claramente nas histórias que os personagens eram os mesmos “mortos” e que poderiam voltar ao universo original.

Mesmo assim, há um consenso geral: o melhor dos títulos (em termo de estrutura de roteiro, enredo e arte) era Fantastic Four. Fantastic Four também era o título “principal”, onde as pistas da resolução do mistério apareciam. Jim Lee desenhou apenas as primeiras 6 edições, mas foi o corroteirista de todas as 12 edições, mostrando organização no que estava produzindo (diferentemente do outro terceirizado…).

Vamos relembrar essa série na segunda parte do post.

Fontes

Revistas referidas

HOWE, SEAN – Marvel Comics The Untold Story

SANDERSON, PETER – Marvel Chronicle

Wikipedia